quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Por uma outra medicina

Comecei este blog com uma poesia. Dizia ela que estou relendo minha história (de ser médico), e re-experimentando o que passou. Quando da primeira vez que o fiz, quase desisti de seguir este caminho (o da medicina). Não é que fosse árido. Muitos colegas passaram pelas mesmas veredas e, embora sofridos também, se encontraram em algum caminho que os fez prosseguir.

Sempre fui um forasteiro. Veja que o único projeto que decidi me engajar era um de palhaços de hospital. A literatura que mais me chamava a atenção era a da estante das ciências humanas. Quando saía com amigos não-médicos, me diziam que eu não parecia ser estudante de medicina. Meus trajes à faculdade despertavam incômodo nos professores mais puritanos. Fiquei para a avaliação final em várias matérias, e não era porque não estudava, mas porque minha forma de pensar a vida e o corpo humano se chocava diretamente com aquela lógica estampada nos cânones. 

Eis que venho descobrindo outras medicinas. Elas existem. Existe vida médica para além da medicina que aprendi na faculdade. Falam sobre outras formas de enxergar o mundo, o homem, as doenças, o retorno à saúde. São outras tantas lógicas. 

Ensinaram-me, os velhos professores, que a história era a resultante das lutas do tempo. Nunca me disseram que entre os destroços do passado havia verdades sepultadas, sufocadas. Pensei que o que chegava hoje em nossos ouvidos era o diamante perfeito, burilado pelos heróis que venceram na história. Nunca me disseram - não com tanta veemência - que a luta destes heróis havia matado gente boa, decepado cabeças formidáveis. Então, o meu ato de re-leitura da medicina, não se contentou apenas em re-ler a que me ensinaram, mas em re-ler toda a medicina. E buscar ouvir os mortos e os moribundos. Venho encontrando os elos perdidos de mim. 

Grandes nomes, dezenas deles, médicos formidáveis acreditaram que a vida era o valor maior, e não a bioquímica, e não a anatomia dos cadáveres desconhecidos. Entendiam que a vida não podia ser reduzida a qualquer fórmula. E, no entanto, vivemos extrapolando nossos remédios diretamente dos laboratórios (in vitro) para os seres vivos (in vivo), sem pudor, como se fosse uma passagem possível e tranqüila. Venho encontrando o meu rosto encarnado nos fantasmas de ontem. Uma nova medicina percorre minha veias e me faz sorrir. Ela vem sendo o retalho de muitas teorias tidas como ridículas. 

Entendi, enfim, porque tive de passar pela palhaçaria até chegar aqui. Não tenho mais medo do ridículo. Aprendi que nele nos movemos e vivemos. Ele é o nosso combustível e a nossa graça. Infeliz aquele que nunca levou uma queda e riu de si. Prossigamos os estudos! 


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